Dia das Mães: idealização x mãe-pessoal-real
- Postado por Sonia Menezes
- Categorias Assuntos Gerais, Cidadania
Chegamos à segunda data mais badalada do ano, perdendo apenas para o Natal.
No cenário ideal, todos estão felizes, todos podem dizer que têm a melhor mãe do mundo.
Infelizmente, a idealização do papel de mãe é algo tão poderoso no imaginário coletivo, que atropela as diferentes realidades que esse assunto contempla.
Em primeiro lugar, vamos lembrar que toda mãe é, antes, uma mulher, uma pessoa. Dessa forma, muito embora a data comemorativa tenha uma intenção de enaltecer e homenagear essa função (importante, delicada, trabalhosa e porque não dizer, perigosa) social, o que acaba acontecendo é um fenômeno de normalização e de rechaço aos casos que fogem ao padrão. Como uma cegueira intencional.
É preciso estar muito atento e consciente, para não reproduzir uma idealização da maternidade que seja composta por romantização do sofrimento, invisibilidade do trabalho doméstico, sobrecarga psíquica, tripla jornada de trabalho, não acolhimento da maternidade nos espaços laborais e acadêmicos.
Todas essas facetas promovem julgamentos, rotulações e adoecimentos mentais.
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Oferecer flores e chocolates, mas não oferecer escuta, compreensão, ombro, colo, acolhimento torna a observação da data superficial e proforma.
Os cuidados com a família são tradicionalmente delegados para a mulher, de forma excludente e solitária. E quando algo não funciona bem, todos sabem a quem culpar.
Mais um problema é o mito do amor incondicional, e outro tão ruim quanto, ou pior: de que a mulher só é completa na maternidade, de que esse amor preenche tudo.
Alguém já ouviu a frase: “nasce uma mãe, nasce uma culpada”?
As mulheres que assumem essa maternidade idealizada se afundam na tristeza, na culpa de se sentirem fracassadas nessa função, pois não existe maternidade que se sustente sozinha.
E não, o amor de mãe não supre todas as necessidades afetivas de uma mulher – quem inventou isso?!
Em outras épocas, mais precisamente antes da revolução industrial, quando as mulheres ficavam somente cuidando de casa e da família, essa atividade era um recorte social, mas na pós-modernidade, quando as mulheres participam da construção da sociedade em todas as pontas, ser mãe tornou-se ainda mais desafiador: sair para trabalhar, cuidar de si, da casa, de filhos. Como resultado, manifestam-se mães que se sentem exaustas, cansadas, e são vistas como más, loucas, bem distantes da mãe que a sociedade (ainda) aguarda assistir.
Eu sempre digo: mães erram com os filhos, porque mães são pessoas em desenvolvimento, e elas têm que ensinar algo sobre o que não sabem, em profundidade, que é sobre como se tornar um adulto com autoeficácia, autonomia, alguém bem-sucedido mental, emocional e fisicamente.
Ser mãe é maravilhoso, sim, consegue ser!
Mas não é que a experiência da maternidade seja igual para todas as mães, longe demais, disso!
A maravilhosidade pode encontrada quando a mãe redescobre seu lugar como pessoa, na relação, e na família, e pode desaprender, reaprender, enquanto compartilha e ensina o que pensa, sente e vive, na tentativa de alcançar sucesso na educação.
Frases como “cadê a mãe dessa criança?” ou “filho de chocadeira” ou “quem pariu Matheus que o embale”, “filho de uma que ronca e fuça”, “você não teve mãe, não?” e outras… estão sempre culpabilizando a mãe pelo insucesso de uma pessoa.
Existem as frases no outro sentido: “ser mãe é padecer no paraíso”; “amor de mãe é infinito”; “aqui é igual a coração de mãe, sempre cabe mais um”.
Nenhuma mulher tem superpoderes, vamos esquecer essa coisa de heroína, já, por favor!
E não, não é verdade que toda mãe tem um comportamento tão exemplar quanto a idealização prevê.
Haverá mães que não conseguem amar seus filhos, haverá mães que tomarão a decisão de entregar seu filho a outro cuidador, haverá mães que usarão seus filhos para conseguir coisas pra si, haverá todo tipo de coisa, porque mães são mulheres, e mulheres são seres humanos que estão sujeitas a passar por todo tipo de experiência e a reagir de maneiras diversas e completamente pessoais.
Verdade, tem gente que não tem “vocação” pra ser mãe, prefere a vida profissional. Verdade, algumas mães vão errar, mesmo.
Precisamos, de outro lado, respeitar que não conseguiu ter essa experiência paradisíaca com sua mãe, e que não consegue comemorar o Dia das Mães.
Precisamos aprender a enxergar que do mesmo jeito que Papai Noel não existe, aquela mãe idealizada também não existe. Precisamos prestar coparticipação na educação e no cuidado de crianças e também cuidar das mães, para que a maternidade não seja um fardo impossível de carregar, que massacre socialmente, a imagem da mulher.
Agora sim, um feliz Dia das Mães, a todas as que estão nessa posição!
Autora: Sonia Menezes
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Sonia Menezes é escritora e psicóloga clínica, especializada em telepsicologia. Com formação em Psicologia, conta com uma Extensão em Ética de Direitos Humanos, e é pós-graduanda em Antropologia e Psicologia Social , e também em Diversidade Sexual e de Gênero. Autora do livro “O Amor, o Amar e os Amantes – Uma conversa sobre relações mono e poliafetivas”. Idealizadora dos projetos:
*Rizoma – Psicologia e Saúde Integral
*Zeitgeist – Grupo de Reflexões sobre Tecnologia e Psicologia
*Co-criar – Mulheres da Mantiqueira
*LibertAmor – Estudos sobre Amor e Relacionamentos.
Amante da natureza, cultiva profundo respeito pela alteridade, solidarizando com os movimentos de libertação humana e libertação animal. Sonha com um mundo onde o sofrimento seja minimizado e acredita que o caminho é o despertar da consciência crítica.